quarta-feira, 29 de outubro de 2008

A Bienal e a Linguagem Contemporânea - Por Alberto Beuttenmüller

(...)A Arte Conceitual nasceu com Marcel Duchamp (1887-1968), o destruidor de todos os conceitos de Arte; em troca, criou novos conceitos, com o intuito de desmistificar a Arte, que era vista por um prisma romântico, uma inspiração dos deuses. Duchamp destruiu até a própria definição de Arte. Duas definições importantes são as de Hegel e de Heidegger. A de Hegel diz: "Arte é manifestação do espírito que o próprio espírito vem a superar" – um conceito dialético. A de Heidegger: "Arte é a projeção da verdade do ser como obra". Verdade, em Heidegger é advento, é um acontecer, um fazer-se temporal cujas figuras mundanas variam.

Duchamp, ao criar os ready-mades, o já feito, criou um produto industrial, que se tornou arte, somente por ele ter-se dele apropriado e ter-lhe dado um nome. A Arte deixava de ser uma manifestação do espírito e também não mais poderia ser a projeção da verdade do Ser. Para exemplificar, o porta-garrafas de Duchamp era em si mesmo um produto da indústria, no qual Duchamp sequer colocou a mão. Virou Arte somente porque ele o nomeou. Para Duchamp, o artista não mais poderia competir com a indústria, pois ela produzia artefatos impecáveis; assim o artista da nova era nomearia o que lhe parecia ser Arte, acumulando ainda o papel de crítico.

A Arte atual, esta que se vê na 25ª Bienal de São Paulo, possui uma linguagem que se auto-refere e é um idioma pós-Duchamp. Não há mais qualquer referência à natureza ou à realidade, mas uma discussão acerca das definições de Arte e dos seus elementos. Uma escultura discute suas dimensões e, por isso, há esculturas bidimensionais, rompendo com o volume. Até o ar que a envolve, não só faz parte dela, mas a integra. A pintura deixou de ser bidimensional para ser um ensaio sobre cores. As técnicas tradicionais, que definiam a escultura, a gravura, o desenho, a pintura deixaram de sê-lo. Uma pintura pode ser uma tela colorida de três dimensões ou um acúmulo de objetos, como na obra de Nuno Ramos, por exemplo. O observador precisa decodificar o conceito que está sendo discutido pelo artista na obra, além da própria definição de arte. Arte é tudo aquilo que você crê que seja Arte; e isso é um alívio. Nem tudo que foi exibido nesta 25ª Bienal, pois, é Arte, bem como tudo que faz parte dos acervos de museus e galerias.

Será que a Bienal já não cumpriu o seu papel de informar as novidades da Arte Contemporânea e formar opinião sobre os novos conceitos? Entrevistando Alfons Hug, ele disse que o Núcleo Histórico foi abandonado porque os centros culturais e até galerias já expõem obras dos artistas históricos. Como exemplo, citamos a pequena retrospectiva de Jesus Rafael Soto, na Dan Galeria.

A pergunta que não quer calar: será que a Bienal ainda traz novos conceitos de arte? Ou será que as galerias e os centros culturais já cumprem este papel? As Bienais dos anos 50 e 60 tinham um papel inovador, mas a partir dos anos 90, com a Internet e com as revistas especializadas on-line, o internauta pode hoje surfar nas ondas das novidades de qualquer museu ou galeria de arte. A Internet está inclusive obrigando as galerias a se tornarem mais atualizadas. Volto a Dan Galeria com a exposição de Soto, um dos papas da arte cinética venezuelana e que, outrora, esteve em diversas bienais dos anos 60. A Dan Galeria vendia somente artistas modernos e já está chegando ao pós-moderno, embora com atraso. A Brito Cimino só faz exposições de artistas conceituais e até a Nara Roesler exibe instalações em seu espaço. Mas voltemos à Bienal.

Nas salas especiais dessa 25ª Bienal pode se ver melhor os conceitos que o público desconhece. A escultura de Carlos Fajardo, dentro de um labirinto, discute o isolamento da arte, mas também é um bloco de granito deitado no chão, a nos propor que não há volume, que ela é bidimensional e que ela rompe com a escultura tradicional de ser um volume no espaço.

A Arte Conceitual é um enigma e tem a ver com a definição de como a verdade acontece na filosofia de Heidegger. "De que maneira a verdade acontece?" – pergunta Heidegger. Ele próprio responde: "um dos modos como a verdade acontece é o ser obra da obra".(...)
FONTE : http://www.digestivocultural.com/ensaios/ensaio.asp?codigo=11

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